Acordo do Mercosul com União Europeia alavancaria exportações no Pará

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Acordo alavancaria exportações — Foto: Divulgação/Fiep

Entenda o que é, como está, os efeitos e as barreiras para a sua aplicação. Governo brasileiro e entidades ligadas às exportações esperam há dois anos ratificação de acordo assinado em 2019.

Ibama sofre com falta de pessoal e recursos, enquanto setores da economia paraense já enfrentam prejuízos.

O governo brasileiro e entidades ligadas às exportações no país esperam, há dois anos, a ratificação de acordo para criar área de livre comércio entre países do Mercosul (Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai) e da União Europeia. O acordo foi discutido por cerca de vinte anos, teve assinatura em 2019, o que havia sido considerado grande feito na gestão de Bolsonaro e, segundo especialistas, poderia alavancar ainda mais a economia do Pará, um dos principais exportadores de produtos agrícolas do país, principalmente junto à Europa.

O consultor jurídico de contratos e negociações internacionais, com mestrado pela Universidade da Califórnia em Direito Internacional Comercial-EUA, Antonio Bernardes, esclarece que o “acordo comercial União europeia – Mercosul teve o objetivo de criar uma área de livre comércio de cerca de 780.000.000 de pessoas, envolvendo os países membros da União Europeia e os países membros do Mercosul, que traz benefícios de redução tarifária e econômico-comerciais para os países dos dois blocos e, ainda uma maior integração político-institucional de médio e longo prazo para os membros”.

Segundo o especialista, esse acordo objetiva, segundo as previsões do governo brasileiro, ampliar as exportações brasileiras em até U$ 100 bilhões nos 15 anos seguintes à sua implantação e atrair investimentos da ordem de U$ 87,5 bilhões para o PIB brasileiro.

O acordo comercial prevê a progressiva eliminação de barreiras alfandegárias e não alfandegárias, a previsibilidade de tarifas favorecidas no comercial bi-regional e a simplificação de procedimentos aduaneiros em todos os membros do Mercosul e UE, o que resultaria na diminuição de custos e tarifas de importação sobre produtos brasileiros e europeus, até a sua eliminação, com consequentemente, no preço final repassado ao consumidor, além de uma maior facilidade nas transações comerciais e aumento de investimentos estrangeiros.

Entretanto, segundo Antonio Bernardes, para o acordo entrar em vigor ele depende da aprovação de todos os países-membros da União Europeia e dos membros do Mercosul, “ou seja, basta um país-membro da União europeia, no Parlamento, votar contra a ratificação do acordo, quando a votação ocorrer, que o acordo comercial não será implementado”.

Agenda ambiental é fator negativo para o Brasil

Antônio Bernardes, consultor jurídico, detalha os benefícios do acordo — Foto: G1 Pará

O consultor jurídico diz que a agenda ambiental já vinha sendo um empecilho, levantado pela França, desde o momento da negociação do acordo, vez que sempre se mostrou mais refratária ao acordo comercial, por conta do setor agropecuário francês.

“Agora, a nova condução política da Alemanha, que antes era grande entusiasta do acordo, assim como os eurodeputados e a agenda da COP26 devem endurecer as exigências para a ratificação deste acordo ou mesmo inviabilizá-lo ao menos a curto prazo e nas condições atuais”, completa Bernardes.

Ele alerta que mesmo que não haja a ratificação do acordo comercial, os membros da União Europeia irão impor mais barreiras ao comércio que promova não só queimadas e desmatamento na Amazônia, como também produza mais efeito estufa.Os princípios do acordo comercial já previam atenção dos envolvidos para o comércio e desenvolvimento sustentável, espacialmente em relação à Amazônia.

“As queimadas e o desmatamento são fatores negativos para a aprovação do acordo, porque no acordo comercial estabelecido em 2019, deveria ser observado o Acordo de Paris pelos signatários, pelo qual o Brasil deveria reduzir, até 2025, a emissão de gás com efeito estufa em 37%, comparado aos índices de 2005, reflorestar 12 milhões de hectares da floresta Amazônica até 2030, e a UE deveria reduzir as emissões domésticas em 40% até 2030”.

Para o presidente do Conselho de Meio Ambiente da Federação das Indústrias do Estado do Pará (Fiepa), Derick Martins, esse acordo tem importância para o Pará, pois aponta benefícios diretos e imediatos para o consumidor que teria acesso a produtos que hoje compra a valores altos em supermercado.

“Uma das premissas do acordo é que ao longo de alguns anos de efetivado seja possível diminuir os custos, a taxações sobre os produtos do bloco da UE com o bloco do Mercosul”, diz Martins. Essa diminuição poderia chegar a quase 90% do que se paga hoje, e de forma gradativa, o que facilitaria as transações comerciais.

“Isso é benefício direto para o consumidor, que poderia comprar produtos direto da União Europeia, a preços mais baratos. Para a indústria, especialmente a local e regional, seria um desafio, porque teriam produtos concorrentes chegando a preços mais competitivos, mas ao mesmo tempo para quem exporta teria facilidade, conseguiria também colocar seus produtos com melhores condições lá fora”, explica Derick.

Ele ainda diz que se efetivando, primeiramente esse acordo deve abrir novos mercados para os produtos de exportação e ter uma ampliação dos produtos que têm como destino final a União Europeia e cita como exemplo a madeira, que hoje sai de manejo florestal no Pará, que já é exportada para os países da UE, como a Bélgica, Holanda, Portugal.

“Então imagino que com esse acordo facilitaria a ampliação desse mercado, de adquirir produto importado daqui, facilitaria o consumo (madeira) e seria oportunidade de outros produtos da floresta com grande potencial serem melhor explorados, e levar para o mundo os ativos florestais. Isso pode ser uma grande oportunidade de negócio, potencial grande que a gente nunca conseguiu transformar em um produto competitivo, a gente tem diferencial comparativo, mas não consegue transformar e talvez a gente tenha aí uma grande oportunidade”, declara Martins.

CNI é a favor de maior integração internacional

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) também tem uma posição favorável a uma maior e melhor integração internacional do Brasil. Segundo o gerente de Políticas de Integração Internacional da CNI, Fabrizio Panzini, o país tem poucos acordos, que são importantes, mas que a União Europeia serviria de integração e ganho de competitividade.

“É importante que a gente tenha uma rede maior de acordos e sendo a UE o maior investidor internacional do Brasil, além de ter sido por muito tempo o maior parceiro comercial – foi ultrapassado nos dois últimos anos pela China -, 60% do que a gente vende para o grupo europeu são de produtos industriais, e pagamos tarifas de importação que variam de 2,5% a 17%. Com o acordo, teríamos um pouco mais de tempo para se adaptar à competição europeia, do que eles conosco”, opina Panzini.

Sobre o Pará, ele acredita que a carne bovina produzida no estado tem chances de ganhar o mercado europeu, assim como minérios, alumínio e produtos agrícolas podem ter tarifa zero e ganhar espaço.

Além disso, o representante da CNI aposta na redução da burocracia para importar e exportar, além do ganho de aumento de participação do comércio nas compras públicas dos países, comércio de serviços e estímulos aos investimentos.

“Além disso ainda deve haver a modernização das aduanas, da atuação dos órgãos intervenientes. O acordo pode sim ajudar indiretamente, porque tem diversos capítulos e um deles é de facilitação de comércio, que também promove a cooperação aduaneira entre os países, que prevê uma movimentação mais célere das mercadorias, então vai demandar de alguma forma que o Brasil continue nessa agenda de facilitação de comércio internacional que ele tem feito para ampliar a celeridade nas exportações, importações, então no momento em que o acordo tem cláusulas de facilitação de comércio que preveem modernização aduaneira, você indiretamente trabalha para que no nosso ambiente interno produza essas reformas”, aposta.

Dificuldades para a ratificação do acordo na União Europeia

Especialistas ouvidos pelo g1 explicam que a fragilidade nas políticas ambientais, além do aumento das queimadas e desmatamento, na Amazônia e Pantanal afetam diretamente a imagem do Brasil e ameaçam a não ratificação do acordo comercial pelos países da União Europeia e que existem questões que podem impactar a economia na Amazônia em cenário de implementação do acordo comercial.

E mesmo ainda longe dessa aceitação, setores ligados à exportação no Pará já enfrentam o sucateamento da fiscalização aduaneira, contabilizando prejuízos milionários, o que também pode ser agravado com uma restrição pela União Europeia à importação de produtos vindos da Amazônia, o que não inclui apenas madeira, mas também outros produtos cultivados e produzidos em área degradada, por conta de medidas de proteção ao meio ambiente.

O Pará tem países europeus como o segundo principal destino para os produtos de exportação, atrás apenas da China. Nos últimos meses, o estado tem registrado problemas nos principais portos por onde são enviados produtos importantes para a economia local. Com os órgãos ambientais cada vez com menos pessoal, recursos e investimentos, segundo os próprios servidores do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama), a autorização para exportação de madeira retirada de áreas de manejo florestal, por exemplo, ficam paradas em portos paraenses, de acordo com a Associação das Indústrias Exportadoras de Madeiras do Estado do Pará (Aimex).

Extração de madeira — Foto: Jornal Nacional
Extração de madeira — Foto: Jornal Nacional

O diretor executivo da Aimex, Eduardo Leão, afirma que em outubro deste ano completava 100 dias que setor madeireiro esteve sem conseguir exportar madeira adequadamente. Isso acontece, segundo ele, por causa da falta de recursos no serviço ambiental, responsável pela liberação de produtos para comércio no exterior. Ele afirma ainda que à época havia dois mil contêineres para serem enviados, mas esbarrou na “inoperância do Ibama”. A situação ainda continua neste mês de novembro.

“É madeira com alto valor agregado de manejo florestal que ficou se acabando. Entre maio e junho o volume de madeira já era além do que o Ibama conseguia fiscalizar, os servidores não estavam preparados para o volume de mil contêineres por mês, muito ainda estão em home office, não recebem diária, não têm como ir no porto verificar as cargas. Nosso setor madeireiro já chegou até a dar férias coletivas e estamos no limite para começar demissões que podem afetar aproximadamente 50 mil pessoas”, revela.

Leão lembra que o estado não está sendo afetado somente no setor madeireiro, mas também na indústria, e defende que o procedimento de autorização poderia ser feito por meio de amostragens. “Essa questão foi até judicializada e houve decisão para que o Ibama resolva a situação, com prazo definido pela Justiça, porque não podemos ficar sem exportar. Posso afirmar que essa é a pior crise do setor florestal que vivemos em anos”.

Sucateamento do Ibama é de conhecimento das autoridades europeias

Uma fonte anônima, servidor do IBAMA no estado do Pará, conta das perseguições a servidores, sucateamento do órgão e do problema com as exportações.

“Na pauta da exportação, são vários problemas, começou com aquela interferência ano passado do então superintendente Walter Mendes Magalhães, e depois o presidente do Ibama, na exportação em que eles desconsideraram produtos que saíram irregularmente e depois desconsideraram a legislação, por conta disso teve a operação Akuanduba da Polícia Federal. Aliado a este problema, nós estamos com uma queda absurda no número de servidores no Ibama de modo geral e no Pará é situação se acentua”, declara o servidor.

Há dez anos o Ibama tinha cerca de 230 servidores somente em Belém, hoje não chegam a 120. “A gente tá com quase um terço do que a gente tinha e uma demanda absurda para responder. não tem como se fazer isso com essa quantidade de pessoal, a gente não vai conseguir dar vencimento na pauta de exportação, trabalhando de maneira correta, analisando tudo que tem que ser analisado”.

Atualmente existem 33 analistas trabalhando na área de exportação, porém, outras demandas ficam prejudicadas, como a biopirataria, pesca, o próprio trânsito da madeira.

“Uma parte desse atraso foi causado pelo superintendente, porque no começo de julho saiu ofício circular da presidência do Ibama dizendo que era para informar naquele momento, a partir do conhecimento do ofício, quem seriam os servidores que fariam isso e que não era mais para emitir autorização fora do sistema, autorizações antes eram emitidas fora do sistema porque não havia solução tecnológica para isso, mas a operação do Alexandre de Moraes forçava que houvesse essa adequação tecnológica e isso passou a ser feito só pelo sistema”, revela.

De acordo com o servidor, o superintendente do Ibama no Pará, Washington Rodrigues veio da Polícia Militar de São Paulo e não tem ligação anterior com a área ambiental e entendeu que não precisava cumprir essa determinação da presidência.

“Ele emitiu quase mil autorizações fora do sistema depois da determinação da presidência do Ibama e da ordem do ministro Alexandre de Moraes (inicial), e não indicou servidores que deveriam fazer essa autorização fora do sistema, isso gerou atraso e acúmulo de mais de mil processos que se tem informado, porque esses servidores só foram indicados no começo de setembro, dois meses depois da determinação, então são várias interferências administrativas que tem prejudicado o trabalho dos servidores, e aí eles estão tendo que dar conta do que está entrando agora, dos pedidos atuais, e desse passivo todo que ficou acumulado porque o superintendente entendeu que ele não precisava cumprir uma ordem do presidente do Ibama”, conta o servidor.

Ele diz ainda que o Ibama deveria ter voltado ao trabalho presencial no dia 15 de outubro e que os servidores se apresentaram, trabalharam, porém foram informados que na segunda-feira seguinte não deveriam ir porque a internet estava cortada.

“O Ibama tem orçamento que já foi muito diminuído ao longo desses anos, acentuadamente diminuído no governo Bolsonaro, além disso os recursos que vêm não tem sido empregados. O índice de emprego do recurso está em torno de 70% pela informação que a gente tem, ou seja, além de diminuir o dinheiro que vai para o órgão, o dinheiro não é gasto e é devolvido ao tesouro da União no fim do ano”.

O servidor conta que para tentar justificar a não utilização do recurso. Ele cita que o Ibama possuía contrato de locação de veículos, o que funcionava bem, uma vez que se houvesse alguma intercorrência no automóvel a locadora era obrigada a fornecer outro carro no mesmo dia para que os servidores continuassem suas atividades. Estava incluso no contrato o combustível e veículo com rádio comunicação. O contrato era pago pelo Fundo Amazônia, que disponibilizava quase 500 veículos para fiscalização.

O Instituto comprou 60 viaturas, sendo uma rastreada. Do total, a maioria está parada, e de acordo com o servidor, as viaturas podem ser utilizadas para qualquer outra função, já que não possuem rastreio, além de que não foi providenciado contrato de manutenção e combustível paralelamente à compra dos veículos.

“Não vão ser empregadas em fiscalização porque não tem garantia nenhuma na hora de dar um problema ser consertada. Então são vários desmandos que prejudicam e muito a atuação dos poucos servidores. Hoje nós temos no Brasil indo a campo cerca de 300 fiscais. Com isto não dá para gente controlar o desmatamento”, diz o servidor que ainda afirma que este ano o Brasil deve bater recorde no desmatamento.

Por Taymã Carneiro, Lissa de Alexandria e Jorge Sauma, G1 Pará — Belém, Pará

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