Arqueóloga faz inventário de restos humanos achados na Amazônia

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Pesquisadora já identificou 50 locais de pesquisa: “material não está tão mal preservados quanto se supunha”, diz Claudia Cunha

Até meados do século 20, a arqueologia na região amazônica preconizava que a Amazônia pré-colonial seria pouco povoada e que a existência dos poucos restos humanos que ali viveram não se preservaria. Porém, novas pesquisas sinalizaram para uma situação oposta e revelaram que a área pode, sim, ter abrigado uma população significativa.

Bolsista do Programa de Capacitação Institucional do Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG) – entidade vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) –, a pesquisadora Claudia Cunha investiga desde 2015 a ocorrência de restos humanos na região. Com o projeto, ela está elaborando a primeira descrição para a morfologia discreta de populações arqueológicas da Amazônia.

“O estudo dos restos humanos sempre esteve em segundo plano na Amazônia, porque acreditava-se que estes seriam poucos e mal preservados. Não havia sequer um inventário de coleções de restos humanos arqueológicos no Goeldi. O meu trabalho comprova que os restos humanos não estão tão mal preservados quanto se supunha e que é possível recolher informação valiosa deles. Chegamos à conclusão de que mais de 50 sítios pesquisados em diferentes regiões da Amazônia produziram esse tipo de material”, conta a pesquisadora.

Com o material, o Museu está construindo uma base de dados sobre a morfologia dentária original de populações ameríndias, que conta com informações dos sítios estudados até o momento. De acordo com a pesquisadora, a análise dentária de coleções produziu resultados sobre aspectos da população de diferentes sítios, épocas e regiões. Apesar de o Museu Goeldi ter realizado trabalhos de antropologia biológica na década de 1980, nenhuma pesquisa focou especificamente na antropologia dentária, o que torna os dados obtidos pela pesquisadora inéditos para a região.

“O sítio do Rosário dos Homens Brancos, por exemplo, forneceu dados importantes sobre a alimentação, saúde e miscigenação da população de Belém [PA] entre os séculos 18 e 19. Entre os exemplares indígenas pré-coloniais do acervo do Museu, descobrimos no decorrer das pesquisas o que parece ser primeiro caso de câncer do palato em um indivíduo pré-colonial amazônico”, afirma Cunha.

A forma dos dentes é geneticamente controlada, pois herdamos características, diferentes formas (ou polimorfismos) de partes dos dentes e das arcadas dentárias de nossos ancestrais. Estudando estas diferenças na forma dos dentes, é possível inferir a que grupo ou grupos humanos (ou região biogeográfica) um esqueleto está biologicamente mais relacionado.

“Fazemos esta análise em vários níveis, tanto comparando, por exemplo, amostras amazônicas de diferentes regiões entre si, como ao compará-las estas com populações indígenas de outras partes das Américas e do mundo. O objetivo principal é saber qual o grau de proximidade biológica entre esses grupos”, diz.

Fronteiras

O trabalho da pesquisadora Claudia Cunha foi tema de conferência apresentada na Universidade de Coimbra, em Portugal, em dezembro passado. Além das revelações inéditas, os dados coletados demonstram o potencial pouco explorado da bioarqueologia na Amazônia. Na maior parte da Europa e América do Norte, a presença de um bioarqueólogo ou antropólogo biológico em campo, tanto na recolha de contextos arqueológicos quanto forenses, é obrigatória por lei. Mesmo não havendo uma legislação que regule essa atuação no Brasil, Cláudia Cunha acompanha toda ação em campo durante as escavações arqueológicas envolvendo restos humanos no âmbito dos projetos de pesquisa da Coordenação de Ciências Humanas do Museu Goeldi.

“Somos treinados para obter informações no terreno que não se recuperam quando apenas recebemos os ossos já escavados. Informações como, por exemplo, como o cadáver foi tratado após a morte, se os ossos estão em contexto primário ou foram reposicionados ou se houve perturbação após o enterro, quer por pessoas ou animais. No lado ético, o trabalho do bioarqueólogo vai além de garantir que os ossos sejam apropriadamente tratados do ponto de vista técnico, é função do profissional garantir que, a nível ético, sejam respeitados parâmetros definidos pela legislação internacional para o tratamento humanitário adequado a contextos funerários”, afirma.

Bioarqueologia no Brasil

Segundo Cunha, há uma noção equivocada de que “não se ganha nada em conhecer o passado”. Num contexto global, apesar de ter uma história e pré-história riquíssimas, a pesquisadora acredita que o Brasil dá pouca atenção à pesquisa e a preservação do seu patrimônio arqueológico.

“Conhecer o nosso passado pode contribuir para a sociedade atual, na medida em que reforça nossa legitimidade no território, resgata a nossa história e responde dúvidas que todos temos sobre o que é de fato ser brasileiro. A arqueologia fornece informações úteis para resolver problemas atuais como o manejo de solos, o uso da flora e fauna por populações que têm 11 mil anos de adaptação à região. Neste caso, um exemplo que contribuiria para aumentar a produção nacional de alimentos e mitigar o problema da fome, seria se descobríssemos exatamente como os grupos indígenas pré-coloniais fabricavam a Terra Preta Antropogênica, uma técnica que os grupos indígenas hoje em dia não dominam. Há arqueólogos no Museu Goeldi e em outras instituições tentando replicar esse processo”, explica.

Para ela, o Brasil tem uma dívida histórica para com esses povos e seus ancestrais de resgatar pelo menos a parte da sua história que ainda encontra-se preservada nos sítios arqueológicos. “É uma dívida para com eles e para com nós mesmos, que temos contribuição indígena na nossa história genética, independentemente de nos considerarmos indígenas ou não. Somos todos frutos da história dos povos que aqui viveram”, acrescenta. As informações são da assessoria de comunicação do MCTI.

Fonte: Notícias ao minuto.
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