“Fora Brancos”-Pichação acende debate sobre racismo na UFPA

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Placas de formatura do curso de Direito receberam os dizeres “fora brancos”
Foto: Tarso Sarraf/O Liberal – A pichação em duas placas de estudantes que se formaram no curso de Direito da Universidade Federal do Pará (UFPA) com os dizeres “fora brancos” e vários riscos nas fotografias acendeu o debate sobre racismo na instituição. No início da tarde de ontem, as pichações já haviam sido apagadas, mas nas redes sociais o caso ganhou contornos de ódio, com vários comentários racistas na foto divulgada. Esta não foi a primeira vez que o curso de Direito teve pichações envolvendo questões raciais.

O advogado Eduardo Martins, de 28 anos, um dos formandos da turma de 2014, foi uma das pessoas que teve sua fotografia pichada. “Primeiramente, fiquei surpreso, posteriormente fiquei indignado, porque a pichação é algo reversível, mas a mensagem é uma carga negativa para todos. É como se compactuássemos com o racismo institucional que vem de décadas e décadas. Ali tem negros também e todos, independente de classe, cor e religião, tiveram de se superar para se formar. Tudo isso foi desconsiderado”, avaliou.

A pichação pode estar relacionada a um caso de racismo que teria sido praticado por seguranças da universidade. No último final de semana quatro jovens negros denunciaram nas redes sociais que foram barrados e revistados na entrada do segundo portão da UFPA, quando se dirigiam a uma comemoração para os calouros do curso de Serviço Social, que fica próximo ao bloco do curso de Direito.

A foto da pichação – que obteve centenas de compartilhamentos – também foi alvo de atitudes preconceitosas e comentários racistas. Para Eduardo Martins, que defende a apuração e o combate a casos de racismo, a repercussão que a imagem tomou nas redes sociais é a demonstração de como muitas pessoas estão despreparadas para um debate tão importante para a sociedade brasileira. “É muito triste, estas mensagens racistas, de gente idiota, mas só que a pichação acabou que deu sinal verde para que mensagens piores viessem à tona. Não estou querendo relativizar nada. Até me surpreendeu bastante a repercussão. Lamento muito mesmo que na discussão de um tema relevante e sério, a maioria das pessoas não esteja preparada e só destilem ódio”, anunciou.

Sobre o caso de racismo denunciado pelos estudantes negros barrados na entrada da UFPA, a instituição informou por meio de nota que a Diretoria de Segurança não havia registrado qualquer ocorrência relacionada ao caso. Segundo o texto, a denúncia está sendo investigada.

Instituto quer tirar lição com debate e cartilha

Devido à repercussão do caso, o diretor do Instituto de Ciências Jurídicas, José Heder Benatti, se reuniu ontem com a diretoria do Centro Acadêmico do Curso de Direito para organizar discussões sobre o combate ao racismo e a discriminação racial dentro da instituição. Benatti pretende que o curso produza, com apoio da UFPA, uma cartilha sobre racismo e discriminação que possa ser distribuída dentro e fora da universidade.

“A partir de uma manifestação tivemos demonstrações do quanto a sociedade está longe de aceitar os outros. Se havia alguma manifestação em torno disso, era que esta pessoa dizia estar fora deste processo. E isso teve uma reação catastrófica na internet. Foi colocado que os negros não têm direito de estar na universidade. Estas pessoas esquecem da história do Brasil que teve 300 anos de escravidão, o que marca profundamente a sociedade ainda hoje”, disse ele. Benatti acredita que as cotas sociais e raciais abriram mais a universidade pública para minorias que sempre foram excluídas. Sobre a repercussão negativa que o fato gerou Benatti pensa que é possível transformar algo ruim em aprendizado.

Em nota, o ICJ também condenou os danos ao patrimônio e disse não admitir manifestações racistas sob hipótese alguma. O instituto fará um amplo debate com o corpo docente, discente e técnico nesta quarta-feira, 24, quando o ICJ receberá a Anistia Internacional para o lançamento da campanha “Jovem Negro Vivo”, às 16 horas, no auditório Hailton Correa. Os discentes que se sentirem lesados de alguma forma podem procurar orientação jurídica na Clínica de Atenção à Violência, que funciona no Núcleo de Prática Jurídica. O Centro Acadêmico de Direito Edson Luís também promoverá, no dia 30 de maio, às 16 horas,  no mesmo auditório, o cine-debate “Discriminação Racial”.

O diretor executivo do Centro Acadêmico, Marvyn Valente, de 24 anos, avaliou que as pichações tinham o objetivo de mostrar que existe racismo na UFPA, mas não acredita que esta seja a melhor forma. “A partir do momento em que combatemos com o discurso de ódio estamos caindo na contramão do que pregamos. Esta é uma discussão muito saudável para um curso que propaga direitos humanos, como o curso de Direito”, afirmou. Para ele, as mensagens de ódio na internet são injustificáveis. “O ato foi um excesso, mas não justifica o discurso propagado na internet. Não se pode apagar o que o movimento negro vem construindo e o racismo do Brasil”, complementou.

A diretora de Direitos Humanos e Movimentos Sociais do CA de Direito, Maura Alves, que é negra, disse que ela própria já foi vítima de racismo dentro da universidade. “No geral a universidade não dá atendimento igual para todos os alunos. Muitos alunos de alguma forma sofrem opressões”, enfatizou. Para Maura, a pichação visava ser uma reação ao racismo dentro da universidade. “A ideia de democracia que temos não existe, porque as pessoas não são ouvidas. Estes atos são para serem considerados errados mesmo, mas são para atingir este ‘statos quo’ da nossa sociedade. São atos para incomodar”, avaliou.
Por: O Liberal
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