PL do Licenciamento abre caminho para grandes empreendimentos dentro de terras indígenas
Foto: Reprodução | Texto afirma que Funai e Ibama podem definir procedimentos para liberar licenciamento ambiental de grandes projetos dentro de terras indígenas – desde que os empreendedores sejam indígenas.
O projeto da Lei Geral do Licenciamento Ambiental, que aguarda sanção ou veto da Presidência da República até esta sexta-feira (8), estabelece que a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e órgãos licenciadores podem definir procedimentos específicos para licenciar empreendimentos dentro de terras indígenas, desde que solicitados por indígenas que queiram realizar explorações em suas próprias terras. O mesmo vale para territórios quilombolas.
A proposta consta no artigo 46 do PL, que diz que Ibama e Funai “poderão, mediante instrumentos de cooperação institucional, dispor sobre procedimentos específicos para licenciamentos cujos empreendedores sejam indígenas ou quilombolas”.
Em entrevista à InfoAmazonia, a diretora Lúcia Alberta Andrade, da Diretoria de Promoção ao Desenvolvimento Sustentável da Funai, explica que o artigo do projeto de lei (PL) traz ameaças para terras indígenas, inclusive em relação à atividade minerária.
“Existe uma pressão muito grande nos órgãos minerários para exploração dentro de terras indígenas. Então, o PL do Licenciamento Ambiental acaba, sim, trazendo ameaças para as terras indígenas. É um perigo, temos que ficar muito atentos, porque ele atropela as disposições que estão na Constituição Federal. Não abre precedentes, mas ameaça”, afirma.
Sob um governo que demonstra preocupação com os povos originários, são poucas as chances de a Funai e o Ibama criarem esses procedimentos citados no PL – no entanto, caso sancionado, o caminho estaria aberto em futuras administrações que não tenham essa preocupação.
Hoje, o Ibama segue uma instrução normativa que garante atividades ou pequenos empreendimentos desenvolvidos pelos povos indígenas em suas próprias terras. Nestes casos, devem ser práticas para subsistência, manutenção do modo de vida tradicional ou garantia da dignidade humana, e não é necessário obter licença ambiental.
Entre as atividades estão: produção de farinha de mandioca e derivados, beneficiamento e fabricação de produtos de arroz, fabricação de material cerâmico, inclusive de barro cozido e material refratário, construção de viveiro de mudas nativas, construção de moradias para usufruto dos indígenas, implantação de postos de vigilância e de apoio à caça, coleta ou extrativismo.
A ex-presidente do Ibama, Suely Araújo, foi quem normatizou essa medida. Ela conta, em entrevista à InfoAmazonia, que isso ocorreu para que os indígenas tivessem menos custos na hora de procurar o licenciamento ambiental. Agora, o artigo está vago, o que pode prejudicar seu entendimento – e abrir espaço para grandes empreendimentos dentro dos territórios.
“Esse texto não é bem-intencionado. Nós fizemos essa norma com boa intenção. Para não ser judicializada a exploração em terra indígena seria necessária uma lei no Congresso Nacional. Agora, coisas muito insignificantes, que não fazem sentido exigir licença ambiental, poderiam ser trabalhadas sem problemas”, afirma.
A diretora Alberta afirma que para legislar sobre exploração dentro de terras indígenas a Funai e os povos indígenas precisam ser consultados. Para garantir que a função de proteger os territórios continue, independente de uma troca de governo. “É bastante delicado esse artigo, eu acho que é isso que é importante ressaltar. Nós temos que ter uma norma do Estado brasileiro para proteção, tanto dos nossos biomas, quanto dos nossos povos. Eu posso responder pela Funai, temos que ter um outro arranjo institucional para resguardar ao máximo o direito desses povos”, diz.
Procurado, o Ibama disse que “por conta dessa proposta ainda não ser homologada”, “não poderá concluir os impactos ambientais de possíveis mudanças”.
Congresso Nacional pela exploração
A Constituição Federal permite a exploração de recursos em terras indígenas, mas determina que, para isso, seja necessária uma “autorização” do Congresso Nacional e que os indígenas participem das decisões. Especialistas ouvidos pela InfoAmazonia afirmam que o PL não regulamenta a Constituição em casos de exploração dentro de terras indígenas, mas determina funções aos órgãos que não condizem com o texto constitucional.
“A questão é que ele está dando uma atribuição normativa para a própria autoridade licenciadora, o Ibama, e para a própria autoridade interveniente, a Funai. E elas deveriam seguir a legislação, não criar normas. É uma delegação legislativa excessiva para um órgão que deveria estar operacionalizando, e não normatizando. Esse artigo tem essa questão. Não é a partir dele que vão definir as atividades em terra indígena. Não deveria ser. Mas essa delegação é mal colocada no dispositivo. E, num governo de direita ou extrema direita, isso pode gerar problemas”, diz Suely Araújo.
Deputados e senadores, no entanto, estão focados em discutir a questão. Não é a primeira vez que o Congresso Nacional busca legislar sobre exploração dentro de terras indígenas. Na Lei do Marco Temporal, aprovada em dezembro de 2023, os deputados já incluíram o exercício de atividades econômicas em terras indígenas, desde que pela própria comunidade indígena, incluindo a contratação de não indígenas.
A lei é alvo de discussão no Supremo Tribunal Federal. O ministro Gilmar Mendes determinou uma Câmara de Conciliação para definir a constitucionalidade do texto. As discussões foram encerradas em junho deste ano, depois de um ano de reuniões. O parecer do ministro ainda não foi publicado.
Esse tipo de articulação institucional, para permitir o avanço de empreendimentos em territórios indígenas, já havia sido ensaiada sob o governo de Jair Bolsonaro (PL). Em 2021, a Funai e o Ibama assinaram uma instrução normativa estabelecendo procedimentos em processos de licenciamento ambiental de empreendimentos no interior de Terras Indígenas, desde que feitos com organizações indígenas.
A norma foi usada para a criação do projeto Agro Xavante, dentro da iniciativa “Independência Indígena“, na Terra Indígena Sangradouro/Volta Grande, no Mato Grosso. Uma cooperativa agrícola para o monocultivo de arroz foi estabelecida dentro do território, com uma divisão de 80% da produção para fazendeiros não indígenas e 20% para os indígenas. O projeto causou conflito entre líderes indígenas do povo Xavante.
A diretora Lúcia Alberta, da Funai, relaciona esses contextos e avalia que a exploração dentro de territórios protegidos está sendo alvo de várias frentes diferentes. “A Lei do Marco Temporal já prevê alguns empreendimentos nos limites das terras indígenas, sem consulta aos povos e sem o devido licenciamento. Então, acho que é importante sempre deixar isso no radar. Não é uma nova lei diferente da Lei 14.701. Ela se soma, é um combo completo para destruir as terras indígenas”, disse.
Além da possibilidade de empreendimentos dentro de terras indígenas, a InfoAmazonia também revelou que o PL do Licenciamento exclui 121 terras indígenas da Amazônia Legal de zonas de proteção no entorno de grandes obras. Das 792 terras reconhecidas pela Funai no Brasil, 289 (36%) ainda não foram homologadas, sendo 121 delas na Amazônia Legal, o equivalente a 26% das TIs da região.
Fonte: Infoamazonia/Jullie Pereira/ Jornal Folha do Progresso e Publicado Por: Jornal Folha do Progresso em 11/08/2025/09:33:38
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