General ex-presidente da Funai se torna conselheiro de mineradora no Pará

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Sem consultar a CEP (Comissão de Ética Pública) do Palácio do Planalto ou se submeter ao sistema de quarentena do governo, o general reformado do Exército Franklimberg Ribeiro de Freitas foi anunciado para o conselho de uma mineradora de ouro apenas quatro meses depois de deixar a presidência da Funai (Fundação Nacional do Índio).

A empresa tem interesses conflitantes com indígenas e depende de uma autorização consentida de duas etnias para iniciar o empreendimento no Pará, atualmente suspenso por ordem judicial.

Em comunicado ao mercado nesta segunda-feira (23), a mineradora canadense Belo Sun Mining anunciou que o general aceitou ser membro do “conselho consultivo de assuntos indígenas e ambientais” da empresa.

Indagada pela Folha sobre a ausência de consulta à CEP, a mineradora respondeu nesta quarta-feira (25) que o general “ainda não recebeu remuneração pela indicação e seu contrato foi assinado com a vigência condicionada ao término da quarentena ou aprovação da Comissão de Ética Pública do Palácio do Planalto”.

A consulta, contudo, não havia sido feita até o anúncio da empresa, como confirmou a CEP à reportagem na tarde desta terça-feira (24): “Não localizamos consulta sobre possível conflito de interesses após o exercício do cargo formulada pelo senhor Franklimberg Ribeiro de Freitas. […] No caso, não tendo sido formulada consulta, não há como afirmar se o senhor Franklimberg deveria ou não estar submetido a período de quarentena”.

A passagem de ocupantes de altos cargos da administração federal, incluindo a presidência da Funai, para a iniciativa privada é regulada por uma lei de 2013, que prevê a necessidade de o interessado consultar a CEP por meio de um formulário eletrônico disponível na internet.

A consulta deve indicar o cargo público ocupado e suas principais atribuições, eventual “acesso a informações privilegiadas”, e o emprego pretendido na iniciativa privada.

A partir desses dados, a CEP estabelece se há potencial conflito de interesses e decide sobre imposição ou não da quarentena, o que impediria “a autoridade de exercer a atividade privada pelo período de seis meses, a contar da data de sua exoneração do cargo público, fazendo jus a remuneração compensatória”.

A mina de Belo Sun pretende ser o maior empreendimento do gênero no país. Por email à reportagem que reproduziu uma manifestação do general, a empresa reconheceu que o militar já visitou o local do empreendimento a convite da mineradora e que manteve contato com comunidades indígenas.

“O general apenas realizou visita ao local onde o projeto deve se instalar. ‘Visitei, a convite da empresa, o local previsto para o projeto, e pude observar o grande interesse dos membros das comunidades locais e indígenas da chegada do empreendimento na região, que certamente, quando aprovado, vai gerar empregos, desenvolvimento local e fortalecimento do território, melhorando a qualidade de vida e o bem estar daquelas populações’”, afirmou a Belo Sun.

A Belo Sun pretende criar, no estado do Pará, a maior mina de ouro do país, mas o empreendimento está suspenso por decisão judicial de primeira instância da Justiça Federal a partir de ação civil pública movida pela Procuradoria da República no Pará. A suspensão foi confirmada pelo TRF (Tribunal Regional Federal) da 1ª Região, em Brasília.

O maior temor de indígenas e indigenistas é o rompimento da futura barragem de rejeitos da mina, o que poderia provocar um acidente como o de Mariana (MG) e afetar diretamente pelo menos duas etnias, os jurunas e os araras.

A contaminação poderia surgir de duas pilhas de rejeito estimadas em 75 e 85 metros de altura, “equivalentes a prédios de 23 e 28 andares”, que serão mantidas em bacia de contenção localizada a cerca de 1,5 km do leito do rio Xingu. Além disso, a exploração do ouro prevê uma série de microexplosões ao longo de mais de 12 anos, segundo a organização não governamental ISA (Instituto Socioambiental).

Em carta aberta desta terça-feira (24), indígenas jurunas rechaçaram a possibilidade de participar de uma negociação com representantes da Belo Sun, pois entendem que o protocolo de consulta defendido pelos indígenas não está sendo respeitado.

“A consulta tem que ser feita pelo órgão do estado que é responsável pela decisão de autorizar ou não a mineradora Belo Sun. […] Consultores contratados por empresas não são as pessoas certas para falar sobre a obrigação de consulta”, diz a carta.

“Não estamos dispostos a permitir que o governo passe por cima de nossos direitos. Também não permitiremos mais empreendimentos na Volta Grande do Xingu sem nos consultar de acordo com nosso protocolo de consulta”, disseram os índios.

A  Volta Grande do Xingu é a região impactada pela construção da hidrelétrica de Belo Monte, inaugurada por Dilma Rousseff (PT).

A advogada Biviany Astrid Rojas Garzón, do ISA, vê com preocupação a contratação do general pela mineradora.

“No cargo de presidente da Funai, ele negociou questões com os indígenas da região, inclusive sobre demarcação de terras. É claro que dá um peso diferente nessa interlocução. Agora o mesmo presidente do órgão indígena defende os interesses de uma mineradora”, disse a advogada.

Na mensagem à Folha, a Belo Sun afirmou que o conselho consultivo, onde o general exercerá cargo, “é estritamente de natureza consultiva, opinativa e multidisciplinar”

“Não há outras responsabilidades além de comentar e opinar sobre itens relacionados a questões ambientais, indígenas e sociais que afetam a empresa. O papel principal do general Franklimberg Ribeiro é aconselhar o CEO [executivo] e o Conselho de Administração canadense sobre as políticas e questões de seus investimentos, para viabilizar as ações da Belo Sun Mining em seus projetos na Amazônia em conformidade com a legislação e realidade socioeconômica vigente no país”.

“Não há interferência direta do conselho no Projeto Volta Grande, apenas o aconselhamento e avaliações externas no processo em curso, quando solicitado pela alta direção da empresa.”

Procurado em seu telefone celular, o general fez declarações por meio da assessoria da Belo Sun.

Segundo a companhia, o general afirmou: “Acredito que minha experiência na Funai não é a única questão que ocasionou o convite. Sou natural da região e possuo experiência de mais de dez anos de atuação no Comando Militar da Amazônia, auxiliando no apoio logístico do Exército em diversas operações humanitárias, possuindo então as credenciais necessárias para participar do Conselho. A constituição deste conselho multidisciplinar é o reconhecimento da empresa de que temas sociais e indígenas ganham reconhecimento e a merecida relevância pelos seus acionistas”.

A empresa e o general não revelaram o valor do salário do novo conselheiro.
Por/;FOLHA UOL
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