Em depoimento, presos transportados em caminhão-cela onde quatro morreram alegam maus-tratos

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Transferência de presos realizada após massacre: 4 mortos em caminhão-cela (Foto:Ivan Duarte)
Susipe contesta versão dos detentos e juíza converteu prisão dos envolvidos para preventiva até que o caso seja esclarecido

Os 22 presos que foram indiciados por homicídio doloso, que estavam no caminhão-cela onde outros quatro detentos morreram durante a transferência, após o massacre do Centro de Recuperação Regional de Altamira (CRRA), ocorrido na segunda-feira (29), relataram terem sofrido maus-tratos durante o percurso. Versão que é contestada pela Superintendência do Sistema Penitenciário do Pará (Susipe).

Segundo os detentos, o caminhão-cela estava superlotado e sem condições para transporte. Em todos os relatos colhidos na audiência de custódia, os presos disseram que o veículo não oferecia ventilação, que a falta de hidratação aliada à alta temperatura fez com que muitos desmaiassem e bebessem a própria urina para saciar a sede.

O defensor público Alysson Castro, que atua junto à 3ª Vara Criminal de Marabá, esteve presente nas audiências, quando os envolvidos no caso foram ouvidos pela juíza Renata Guerreiro Milhomem. Segundo o defensor, os presos disseram que saíram por volta das 13 horas de Altamira e não foi permitido o almoço.

Ainda segundo os detentos, durante o trajeto, bateram na lataria o veículo para reclamar do calor e pedir água, mas não foram atendidos. “Eles disseram ainda que o motorista dirigiu em alta velocidade, sem reduzir em lombadas ou buracos, fazendo com que os presos se batessem constantemente, caindo uns por cima dos outros”, disse o defensor.

Questionada sobre esses relatos, a Susipe informou, em nota, que o plano usado no transporte dos 30 presos de Altamira para Belém, iniciado na última terça-feira (30), foi o mesmo já usado em outras quase 800 movimentações de detentos feitas este ano no Pará, todas com sucesso. “O traslado foi feito dentro das regras e em veículo de modelo estabelecidos pelo Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN)”, disse o órgão.

A Susipe também informou que, de acordo com o laudo pericial realizado pelo Centro de Perícias Científicas Renato Chaves (CPCRC) no caminhão-cela, o sistema de exaustão (ventilação) estava em pleno funcionamento, além de o veículo possuir abertura para entrada de ar, descartando-se, preliminarmente, a hipótese de mortes causadas por confinamento. “Além disso, o laudo também aponta que uma das algemas plásticas continha vestígios de sangue e fios de cabelo. A perícia concluiu, portanto, que as vítimas vieram a óbito em virtude de asfixia mecânica do tipo estrangulamento/esganadura”, conclui o comunicado.
Presos dizem ter bebido urina e negam ter matado internos

Os detentos também afirmam que, em certo momento, por não suportar mais a sede, resolveram beber a urina. “Uns contam que urinaram em uma garrafa para beber a própria urina, enquanto outros disseram que, em algumas situações, um detento urinou direto da boca do outro. Outros contaram que consumiram o próprio suor, espremendo camisas encharcadas para ter algum líquido”, relatou o defensor Alysson Castro.

A reportagem teve acesso ao documento emitido ao fim da audiência de custódia onde todos os relatos descritos pelo defensor estão registrados.

Seis dos detentos relataram que beberam urina para matar a sede, enquanto os outros disseram que viram os companheiros de cela fazê-lo, além de relatarem vômitos e desmaios.

Quando questionados se mataram os outros internos no caminhão-cela, os detentos negaram e disseram que as mortes foram causadas por desidratação e sufocamento. “Eles (os presos) disseram que todos ali eram ‘irmãos’ da mesma facção [o Comando Classe A] e não tinham motivos para matar os outros detentos. Os internos responderam que ‘eles morreram porque estavam mais fracos que nós, doutora’, quando a juíza perguntou a causa das mortes”, relatou o defensor.

Após o fim dos relatos, a juíza Renata Guerreiro Milhomem cedeu a palavra para o defensor público e à representante do Ministério Público do Estado do Pará (MPE/PA), Cristine Magela Correia. Ambos se manifestaram contrários à homologação do auto de prisão em flagrante pela morte dos quatro detentos.

Ainda segundo Alysson Castro, essa decisão foi tomada devido às dúvidas levantadas durante a audiência, e uma investigação mais aprofundada foi iniciada pelo MPE/PA.

“Somente um laudo mais conclusivo pode determinar se realmente houve homicídio ou se os internos morreram por causa das condições relatadas, e é isso que vamos aguardar”, disse o defensor.

Todas as manifestações na audiência foram gravadas, sendo que uma cópia foi anexada aos autos do processo e outra cópia será arquivada na Secretaria da 3ª Vara Criminal da Comarca de Marabá.
Laudo aponta asfixia mecânica

Na decisão que estabeleceu a prisão dos 22 internos pelas mortes no caminhão, a juíza destaca que, pelos depoimentos, ficou claro que as pessoas mortas estavam com os autuados, sendo que o laudo pericial aponta a ocorrência de asfixia mecânica, o que exige, necessariamente, a atuação de um indivíduo sobre o outro.

“[…] Os falecidos se encontravam em celas com diversos dos autuados, alguns dos quais podem haver cometido efetivamente os atos executórios e outros se omitido em evitar a ocorrência dos crimes”, diz a decisão.

Contudo, com os relatos dos presos e a manifestação do MPE/PA e da Defensoria Pública, a juíza decidiu converter a prisão em flagrante para prisão preventiva, até que seja esclarecido em definitivo o que, de fato, ocorreu no caminhão-cela que resultou nas mortes.

Foi a juíza Renata Guerreiro Milhomem quem determinou que a Susipe transportasse os detentos por meio aéreo, para que esse tipo de caso ocorrido na estrada não se repetisse.

Para Alysson Castro, o processo ainda está em uma fase muito preliminar para descartar outras possibilidades, que não homicídio, para as mortes no caminhão.

“Esses relatos dão ensejo para um manancial de possibilidades, ou pelo menos nos provocam um outro olhar sobre o fato. Vamos aguardar os laudos com a causa mortis dos detentos para, somente aí, sabermos que medida vamos tomar junto ao MP”, concluiu o defensor.
Relação dos envolvidos

Responsabilizados pelas mortes:

Antonio Carlos De Sousa Silva
Bruno Tulio Mendes David
Bueno Victor Da Silva Gomes
Elimar Salustiano De Sousa
Higo Blando Veiga Vieira
Jackson Silva Lemos
Jeferson Dos Santos Costa
Joerbert Dos Santos Guimarães
Joeferson Alves De Souza
Keven Loureiro Monteiro
Lucas Oliveira De Almeida
Marcelo Teixeira Pereira
Marcos Dos Santos Da Silva
Marlison Duarte De Brito
Marlon Ribeiro Gomes
Ozeias Oliveira Souza
Reiris Silva De Souza
Romary Dos Santos
Sidicley Queiroz Da Silva
Sued Farias Guimarães Junior
William Pereira Da Silva
Willkiner Thiago Alves Dias

Não foram autuados:

Cirineu Dos Santos Gomes
Geniel Moia Da Costa
Jose Marcos Reis Da Silva
Lucas Gomes De Oliveira

Por:ORM

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