O Brasil entrega o alumínio da Amazônia a multinacionais

image_pdfimage_print

(Foto:Reprodução) – Estamos tendo o triste privilégio de contemplar o frustrante desfecho de meio século de luta para montar um polo de alumínio na Amazônia de grandeza mundial, capaz de induzir um processo de desenvolvimento regional. Estancamos na produção de metal primário.

Para trás do processo temos a terceira maior jazida de bauxita do mundo, a maior fábrica de alumina do mundo fora da China e a oitava maior metalúrgica de alumínio do mundo. Para frente, só uma unidade menor de produção de vergalhões e cabos de alumínio.

Todos os passos à frente na transformação do produto foram transferidos para fora do Brasil, em benefício do comprador das nossas commodities, cristalizando nossa condição colonial. É em outros países, principalmente da Ásia (a China, depois do Japão) que ocorre o efeito multiplicador dos investimentos. Situação inalterada há quase 40 anos.

Depois da completa privatização de toda a cadeia do alumínio, que resultou da privatização da principal agente do processo, a CVRD, assistimos neste momento a desnacionalização desse setor, sem que possamos acompanhar realisticamente o que acontece e tentar intervir nessa história, da qual nos tornamos meros espectadores. O único resíduo (mais simbólico do que efetivo), os 10% do capital da mineradora de bauxita, a MRN, pertence ao grupo CBA, da família Ermírio de Moraes, de São Paulo.

Para arrematar a ironia, a única presença estatal é a do governo da Noruega, acionista da multinacional Hydro, que vendeu os seus 5% na MRN e 30% na Alunorte para a suíça Glencore (enquanto a Vale se retirava definitivamente da produção de bauxita, passando à mesma Glencore, por tabela da Hydro, seus 40%, meio século depois de ter ingressado na Rio do Norte, justamente para não permitir que a jazida do Trombetas fosse só da canadense Alcan).

Acompanhando meus artigos, o geólogo Breno Augusto dos Santos, a maior autoridade em mineração na Amazônia, me mandou um precioso testemunho sobre a história da criação do polo de alumínio na Amazônia; na verdade, no Pará. Transitando entre empresas nacionais e internacionais, sem distingui-las como pressuposto, por um nacionalismo obtuso, Breno é dos que se empenhou em ir além da mineração para chegar à metalurgia e siderurgia no próprio Pará. Por isso, partilha esse gosto acre de derrota, que deve estar sendo sentido por todos os poucos que têm consciência do que acontece.
Reproduzo a seguir o texto de Breno.

Pouca gente sabe que a criação da Docegeo [empresa de pesquisa geológica da Companhia Vale do Rio Doce], como braço da diversificação mineral da CVRD, fez parte de um plano do governo federal, tendo como ministro de Minas e Energia o engenheiro Antônio Dias Leite Júnior, para maior controle nacional das riquezas do subsolo brasileiro.

Esse plano incluiu o Projeto Radam [Radar da Amazônia] e a Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM), como Serviço Geológico do Brasil. A então recente descoberta do ferro de Carajás havia influído na tomada dessa decisão.

Há menos divulgação ainda sobre as atribuições que foram dadas à Docegeo, pelo governo federal, logo no início de sua criação: descobrir depósitos de cobre, pois o Brasil era altamente dependente da importação de concentrados; descobrir depósitos de crômio, missão que nunca teve a sua razão bem entendida e foi abandonada; e requerer e pesquisar todas as áreas potenciais para depósitos de bauxita na Amazônia, começando pela região de Paragominas, onde a multinacional RTZ havia descoberto importantes depósitos no ano anterior.

Após a descoberta dos depósitos de bauxita no Suriname, os platôs cretáceos ou terciários da Amazônia passaram a ser o alvo de algumas das “Sete Irmãs do Alumínio”, na segunda metade dos anos 1960. A Alcan teve sucesso no Trombetas, em Oriximiná, e a Alcoa pesquisava na região do Juruti; a Kaiser também havia atuado em alguns platôs. O governo federal temia perder totalmente o controle da produção de minério de alumínio na Amazônia.

Como decorrência, o requerimento das áreas potenciais para depósitos de bauxita passou a ser a missão mais urgente da Docegeo, logo após a sua criação.

O saudoso geólogo Octávio Ferreira da Silva foi incumbido dessa importante atividade. Segundo informação do amigo Octávio, por falta ainda de sede da Docegeo, os requerimentos foram efetuados em um quartel da Marinha, com direito à proteção de sentinelas, tendo como base as antigas imagens da USAF [força aérea dos Estados Unidos] para selecionar os platôs da região de Paragominas

Logo o Distrito Amazônia da Docegeo passou a cumprir com as suas equipes as missões que haviam sido dadas à CVRD, e com ótimos resultados.

Na pesquisa de bauxita, a equipe coordenada pelo geólogo Roberto Assad descobriu e avaliou os depósitos de bauxita de Jabuti e de Tiracambu, na região de Paragominas, e de Berenice, na região de Almeirim. Outros depósitos menores também foram pesquisados em toda Amazônia, até as proximidades de Manaus.

O sucesso também foi grande na busca de depósitos de cobre em Carajás. Em 1977, a equipe coordenada pelo saudoso geólogo Décio Meyer, a partir dos bons resultados geoquímicos obtidos desde 1974, descobre o depósito de cobre-ouro do Salobo, onde hoje está em produção a mais importante mina do Brasil.

Esse fato motivou a descoberta, pelas equipes da Docegeo, de mais de uma dezena de depósitos de cobre em Carajás. Além da mina do Salobo, também está em atividade a do Sossego e outras menores.
Na questão do alumínio, em 1974, no início do governo de Ernesto Geisel, tendo como Ministro de Minas e Energia o Shigeaki Ueki, foi decidida a construção da usina hidrelétrica de Tucuruí, para possibilitar a implantação do complexo de alumínio e de alumina, Albrás – Alunorte, em Vila do Conde, no município de Barcarena.

CVRD foi convocada para ser sócia de empresas japonesas na implantação e operação do projeto, sob a coordenação inicial do Diretor de Desenvolvimento Eduardo Carvalho.

Os depósitos pesquisados em Paragominas, pela Docegeo, serviram como garantia inicial de suprimento de bauxita, para atender aos acionistas japoneses. Posteriormente, a CVRD adquiriu a jazida que havia sido descoberta pela RTZ, para suprimento, por mineroduto, da planta da Alunorte.

Em 1975, outra decisão é tomada para que a área de alumínio passasse a ser a segunda em importância nos negócios da CVRD, logo após o minério de ferro. Foi decidida a implantação da mineração de bauxita no Trombetas, que havia sido protelada pela Alcan, tendo agora a liderança da CVRD e a participação da CBA na Mineração Rio do Norte – MRN.

Ficou claro que a entrada da CVRD na área do alumínio, do minério ao metal, foi antes de tudo uma decisão do Estado brasileiro, considerando mais os interesses nacionais que os da empresa.
Assim, em menos de uma década, os objetivos determinados pelo governo federal, em 1971,  haviam sido atingidos: o controle da produção de alumínio na Amazônia e a descoberta de importantes depósitos de cobre em Carajás.

Mas os trabalhos de pesquisa da Docegeo levaram à descoberta ou à avaliação de outros minérios, com o ouro e o caulim, que também passaram a pertencer às áreas de produção e de negócios da CVRD.
Entretanto, após a privatização, algumas áreas de negócios, como a de ouro e de caulim, pelo pequeno porte e pequena margem de lucro, começaram a ser abandonadas pela nova Vale.

E, em tempos mais recentes, após a privatização total da antiga CVRD, iniciada no governo Fernando Henrique Cardoso, mas completamente finalizada nos governos Temer e Bolsonaro, a área de negócios de alumínio, do minério e ao metal, talvez pela sua complexidade, que envolve custos de energia, deixou de ser atrativa para os novos donos da Vale. A empresa resolveu concentrar a sua produção e comercialização no minério de ferro e em metais base, notadamente cobre e níquel.

Hoje a Vale, como empresa totalmente privatizada, tem que dar prioridade aos interesses e aos lucros de seus acionistas. Deixou de ser uma empresa para atender prioritariamente políticas de desenvolvimento do Estado brasileiro.

Assim, a missão determinada pelo governo federal, em 1971, e cumprida com êxito pela antiga CVRD, nada adiantou.

Passado pouco mais de meio século, a produção de alumínio na Amazônia, do minério ao metal, está sob controle multinacional.

Fonte e Publicado Por:Jornal Folha do Progresso em 03/05/2023/10:46:30 Com informações do Amazonia Real/Lúcio Flávio Pinto.

 Notícias gratuitas no celular

O formato de distribuição de notícias do Jornal Folha do Progresso pelo celular mudou. A partir de agora, as notícias chegarão diretamente pelo formato Comunidades, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp. Não é preciso ser assinante para receber o serviço. Assim, o internauta pode ter, na palma da mão, matérias verificadas e com credibilidade. Para passar a receber as notícias do Jornal Folha do Progresso, clique no link abaixo e entre na comunidade:

*     Clique aqui e acesse a comunidade do JORNAL FOLHA DO PROGRESSO

Apenas os administradores do grupo poderão mandar mensagens e saber quem são os integrantes da comunidade. Dessa forma, evitamos qualquer tipo de interação indevida. Sugestão de pauta enviar no e-mail:folhadoprogresso.jornal@gmail.com.

Envie vídeos, fotos e sugestões de pauta para a redação do JFP (JORNAL FOLHA DO PROGRESSO) Telefones: WhatsApp (93) 98404 6835– (93) 98117 7649.
“Informação publicada é informação pública. Porém, para chegar até você, um grupo de pessoas trabalhou para isso. Seja ético. Copiou? Informe a fonte.”
Publicado por Jornal Folha do Progresso, Fone para contato 93 981177649 (Tim) WhatsApp:-93- 984046835 (Claro) -Site: www.folhadoprogresso.com.br   e-mail:folhadoprogresso.jornal@gmail.com/ou e-mail: adeciopiran.blog@gmail.com

%d blogueiros gostam disto: